Condenar o erro e não o errante

Motivado pelos desdobramentos do triste episódio da semana passada, em que a torcedora gremista, Patricia Moreira da Silva, 23 anos, insultou o goleiro santista Aranha, em partida válida pela Copa do Brasil, fui procurar na legislação brasileira uma definição para o termo “racismo”.

O portal JusBrasil, fazendo referência ao dicionário Aurélio, define o racismo como “doutrina que sustenta a superioridade de certas raças.” Racismo, portanto, explica o artigo do JusBrasil, é “uma doutrina sustentada pela ideia de que uma raça é superior à outra e que, assim o sendo, resulta na marginalização, segregação e separação de uma raça em detrimento de uma outra, por declarar-se superior”.

O polêmico episódio e a torcedora gremista

Diante da definição acima, procurei refletir se realmente é correto afirmar, categoricamente, que Patricia Moreira é racista. Não sei como será feita a investigação do caso, mas massacrar a jovem gremista pela sua atitude, errônea, certamente, me parece não só exagerado, mas, um tanto quanto hipócrita. Houve sim um comportamento racista, mas isso não quer dizer que ela ou os torcedores gremistas sejam racistas na sua essência, como muitas pessoas acabaram afirmando.

Foto: Bruno Cambraia/Flickr

Eu também já fui vítima de uma atitude racista quando morava na Itália. Após sair de um supermercado, após a suspeita de que havia roubado algo, supostamente por ser o único no recinto de pele escura, passei por uma revista humilhante, como se fosse um bandido, que me feriu interiormente. Claro que, no calor do ocorrido, também generalizei, afirmando que o povo italiano era racista, o que certamente não é verdade. Contudo, o grande aprendizado que tive com aquele acontecimento foi descobrir a importância de perdoar meus agressores, para me libertar daquele sentimento negativo que estava me fazendo mal.

No caso da agressão da jovem gremista, o goleiro Aranha disse, inicialmente, que não iria perdoar Patricia. Alguns dias depois, após o pedido de desculpas, o jogador santista voltou atrás e perdoou a jovem, exigindo porém que seja punida pela atitude.

Neste ponto, concordo com Aranha. Não podemos admitir, em lugar algum, esse tipo de atitude. O racismo percorreu a história da humanidade deixando sequelas que nos afligem até hoje. Contudo, é preciso punir, com a mesma severidade, o racismo estrutural, visível nas prisões, empresas, universidades e que causa danos muitos maiores.

A força do perdão

Foto: Fare Network/Flickr

Infelizmente, a mídia “caçadora de manchetes e cliques” polemizou o acontecimento, condenando mais o errante do que refletindo sobre o erro em si. Todos erramos e, na maioria das vezes, devemos pagar pelos nossos erros. É importante procurar formas de evitá-los e, quando não conseguirmos, desenvolvermos também a capacidade de nos perdoarmos.

O perdão tem uma força avassaladora, pois não só resolve os conflitos, mas permite que o mal não se propague. Ontem, durante o Angelus – oração dominical cristã pronunciada pelo Papa no Vaticano – o Papa Francisco, comentando o Evangelho do dia (que demonstrava como o cristão deve se comportar diante de uma pessoa que lhe ofendeu), explicou que a amargura do coração traz ira e ressentimento e nos leva a insultar e agredir. “Insultar não é cristão”, disse, repetidamente, Francisco.

Punir é um dever do Estado. Perdoar é um dever do ser humano. A lição que o Esporte nos dá essa semana serve para repensar nossas atitudes pessoais, para que não desenvolvamos uma hostilidade crônica diante dos nossos iguais.



Sobre

Fazer do esporte um instrumento de promoção da fraternidade é aceitar o desafio de descobrir, acima de tudo, a prática de atividades físicas como possibilidade de encontro, de relação. Em uma competição esportiva, o adversário não é um inimigo, nem o jogo uma batalha. Por isso, respeitar as regras predefinidas e preservar um espírito de lealdade e honestidade tornam-se elementos essenciais para que o esporte realize a sua missão socioeducativa. Neste blog, queremos identificar, discutir e descobrir os grandes promotores do esporte no Brasil e no mundo e, com eles, refletir sobre valores que ajudam a edificar a nossa sociedade.

Autores

Valter Hugo Muniz

Jornalista com experiências internacionais na Ásia (Indonésia) e na África (Costa do Marfim). Atualmente mora em Genebra, na Suíça. É formado em jornalismo pela PUC-SP. Trabalhou em agências de comunicação, empresas multinacionais, editoras e na televisão. Concluiu recentemente uma pós-graduação no Instituto Universitário Sophia, em Florença, Itália.