Religião / Espiritualidade
  

A verdadeira força da Igreja é a fraqueza

A Igreja de 27 de abril de 2014 é forte quando volta-se para as periferias existenciais e suas chagas.

por Michele Zanzucchi - Città Nuova   publicado às 11:00 de 28/04/2014

“As chagas de Jesus podem ser de escândalo para a fé, são também a verificação da fé. Por isso, no corpo de Cristo ressuscitado, as chagas não desaparecem, continuam, porque aquelas chagas são o sinal permanente do amor de Deus por nós”, afirmou o papa Bergoglio, em sua homilia durante a cerimônia de canonização de seus dois antecessores ilustres, Roncalli e Wojtyla, concelebrada pelo seu antecessor direto Ratzinger, “aquele que se demitiu”.

27/04/2014 - Papa Francisco durante a canonização de seus antecessores ilustres, João XXIII e João Paulo II. Foto: Santiago Armas/Presidencia de la República del Ecuador

Feridas evidentes em uma Roma sombria e, ao mesmo tempo, belíssima, ocupada pelas milhares de pessoas vindas ao grande evento. Na carne dos fiéis e menos fiéis: a deficiência, o kitsch de tanta ostentação cultural, a “pequenez” de tanta gente humilde, a necessidade de uma roupa impecável para sentir-se alguém, a necessidade de certezas para crer... A fraqueza é evidente no meio da multidão que reza em silêncio,  que observa as telas gigantes, que joga as mãos para o céu, que mordisca um sanduíche, nos jovens que papeiam, nos idosos que se arrastam, nos adultos que seguem de mãos dadas com quatro, cinco pirralhos. As pessoas. O povo de Deus, pelo amor de Deus.

Os comentários midiáticos sobre a cerimônia da Praça de São Pedro, um credo único inatingível, enfatizam justamente a força demonstrada pela Igreja na ocasião. Riccardi, Ruini, Veneziani, Batista, Bianchi, todos escrevem comentários que manifestam um indisfarçável orgulho por descobrir uma adesão inimaginável às mensagens dos papas, dos bispos de Roma. Poder terreno da Igreja? Sim, existem aqueles que acreditam e trabalham neste sentido. Mas a Igreja dos papas Bergoglio, Ratzinger, Wojtyla e Roncalli é principalmente uma Igreja de misericórdia e amor, mesmo aquela de Bento XVI, o que quer que se diga.

Não por acaso Bergoglio lembra Roncalli como “um guia guiado pelo Espírito Santo” e elogia a sua docilidade a esse Espírito. Ao mesmo tempo, lembra Wojtyla como “o papa da família”. Duas características certamente fortes, mas apenas porque têm origem na consciência da irredutível fraqueza humana. Com Paulo precisamos repetir que somos fortes quando temos a consciência de sermos fracos.

A Igreja de 27 de abril de 2014, reunida em Roma, em torno de seu atual bispo, é forte porque é fraca, porque faz de suas fraquezas suas armas, porque “tudo espera, tudo perdoa, porque sempre ama”, como explica o próprio Francisco. Uma Igreja de saída, voltada para as periferias existenciais e suas chagas.

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