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"Só a paz é santa, não a guerra!” diz Francisco em Assis

O papa participou nesta terça-feira do Dia Mundial de Oração pela Paz, um encontro interreligioso com mais de 500 líderes de nove diferentes religiões

por Rádio Vaticano*   publicado às 14:15 de 20/09/2016, modificado às 14:15 de 20/09/2016

O papa Francisco participou nesta terça-feira (20), na cidade italiana de Assis, em Perugia, do Dia Mundial de Oração pela Paz, um encontro Interreligioso com mais de 500 líderes de nove diferentes religiões. Além do compromisso com os religiosos, Francisco almoçou com um grupo de 25 refugiados que moram na região e são assistidos tanto pela Comunidade de Santo Egídio, que organiza o evento, quanto por entidades religiosas locais.

Papa Francisco em Assis, acompanhado de centenas de líderes religiosos, durante o Dia Mundial pela Paz. Foto: Comunidade de Santo Egídio

“Não podemos ficar indiferentes. Hoje o mundo tem uma sede ardente de paz. Não temos armas; mas acreditamos na força mansa e humilde da oração", afirmou o pontífice na cerimônia conclusiva. Na esteira do 30º aniversário do histórico Encontro de Oração pela Paz convocado por João Paulo II em 27 de outubro de 1986, que reuniu líderes religiosos do mundo inteiro, o evento desta terça-feira teve como tema “Sede de Paz. Religiões e Culturas em Diálogo”, promovido pela Diocese de Assis, pelas Famílias Franciscanas e pela Comunidade romana de Santo Egídio.

Já no início de seu discurso, após agradecer aos ilustres representantes das Igrejas, Comunidades cristãs e Religiões pela presença e participação, Francisco lembrou que todos se encontravam reunidos em Assis como peregrinos à procura da paz, movidos pelo desejo de testemunhar a paz, sobretudo pela necessidade de rezar pela paz, “porque a paz é dom de Deus e cabe a nós invocá-la, acolhê-la e construí-la cada dia com a sua ajuda”, frisou.

“Sair, pôr-se a caminho, encontrar-se em conjunto, trabalhar pela paz: não são movimentos apenas físicos, mas sobretudo da alma”, acrescentou. “São respostas espirituais concretas para superar os fechamentos, abrindo-se a Deus e aos irmãos. É Deus que no-lo pede, exortando-nos a enfrentar a grande doença do nosso tempo: a indiferença”.

Em seguida, o papa caracterizou essa grande enfermidade: “É um vírus que paralisa, torna inertes e insensíveis, um morbo que afeta o próprio centro da religiosidade produzindo um novo e tristíssimo paganismo: o paganismo da indiferença”.

“Não podemos ficar indiferentes. Hoje o mundo tem uma sede ardente de paz. Em muitos países, sofre-se por guerras, tantas vezes esquecidas, mas sempre causa de sofrimento e pobreza”, disse Francisco, lembrando sua visita à ilha grega de Lesbos (16 de abril passado), na qual viu nos olhos dos refugiados o sofrimento da guerra, a angústia de povos sedentos de paz.

“Penso em famílias, cuja vida foi transtornada; nas crianças, que na vida só conheceram violência; nos idosos, forçados a deixar as suas terras: todos eles têm uma grande sede de paz. Não queremos que estas tragédias caiam no esquecimento. Desejamos dar voz em conjunto a quantos sofrem, a quantos se encontram sem voz e sem escuta. Eles sabem bem – muitas vezes melhor do que os poderosos – que não há qualquer amanhã na guerra e que a violência das armas destrói a alegria da vida.”

“Não temos armas; mas acreditamos na força mansa e humilde da oração. Neste dia, a sede de paz fez-se imploração a Deus, para que cessem guerras, terrorismo e violências”, disse ainda o Santo Padre.

A paz que invocamos, a partir de Assis, não é um simples protesto contra a guerra, nem é sequer "o resultado de negociações, de compromissos políticos ou de acordos econômicos, mas o resultado da oração", acrescentou Francisco citando palavras João Paulo II no Encontro de Oração pela Paz de 30 anos atrás.

“Procuramos em Deus, fonte da comunhão, a água cristalina da paz, de que está sedenta a humanidade: essa água não pode brotar dos desertos do orgulho e dos interesses de parte, das terras áridas do lucro a todo o custo e do comércio das armas.”

Dirigindo-se aos líderes religiosos, o Papa lembrou que nossas tradições religiosas são diversas, “mas para nós, a diferença não é motivo de conflito, de polêmica ou de frio distanciamento”.

“Hoje não rezamos uns contra os outros, como às vezes infelizmente se deu na História. Ao contrário, sem sincretismos nem relativismos, rezamos uns ao lado dos outros, uns pelos outros. Continuando o caminho iniciado há trinta anos em Assis, onde permanece viva a memória daquele homem de Deus e de paz que foi São Francisco, 'uma vez mais nós, aqui reunidos, afirmamos que quem recorre à religião para fomentar a violência contradiz a sua inspiração mais autêntica e profunda. Não nos cansamos de repetir que o nome de Deus nunca pode justificar a violência. Só a paz é santa; não a guerra!”, exclamou o Papa.

Francisco ressaltou que a oração e a vontade de colaborar implicam uma paz verdadeira, não ilusória: “não a tranquilidade de quem esquiva as dificuldades e vira a cara para o lado, se os seus interesses não forem atingidos. Não o cinismo de quem se lava as mãos dos problemas alheios; não a abordagem virtual de quem julga tudo e todos no teclado dum computador, sem abrir os olhos às necessidades dos irmãos nem sujar as mãos em prol de quem passa necessidade”, enfatizou.

Após afirmar ser a paz um fio de esperança que liga a terra ao céu, o Pontífice disse tratar-se de uma palavra tão simples e ao mesmo tempo tão difícil. "Paz quer dizer perdão, acolhimento, colaboração e educação", disse.

Concluindo, o Papa lembrou que nosso futuro é viver juntos. “Por isso, somos chamados a libertar-nos dos fardos pesados da desconfiança, dos fundamentalismos e do ódio. Nós, como Chefes religiosos, temos a obrigação de ser pontes sólidas de diálogo, mediadores criativos de paz. Dirigimo-nos também àqueles que detêm a responsabilidade mais alta no serviço dos povos, aos líderes das nações, pedindo-lhes que não se cansem de procurar e promover caminhos de paz, olhando para além dos interesses de parte e do momento.”

A paz é uma responsabilidade universal, lembrou Francisco, fazendo uma exortação: “Assumamos esta responsabilidade, reafirmemos hoje o nosso sim a ser, juntos, construtores da paz que Deus quer e de que a humanidade está sedenta.”

*Texto original publicado por Rádio Vaticano e editado por Cidade Nova

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