O que dizer das eleições

Menos de uma semana após o primeiro turno das eleições presidenciais, arrisco-me a apresentar algumas conclusões preliminares. Assumo o risco de incorreções decorrentes da pouca distância no tempo entre este texto e os eventos que colocaram Dilma, Aécio e outros 28 candidatos estaduais no segundo turno.

1 – As pesquisas

Elas erraram feio. Em tempos de facebook e whatsapp, as chacotas multiplicam-se à exaustão e deixam nossos dias um pouco mais divertidos. Para além disso, os equívocos mostraram mais incompetência do que uma suposta tendência ideológica para cá ou para lá. A realidade é que depois de domingo, será muito difícil sustentar qualquer afirmação conspiratória de que as pesquisas favorecem o PSDB, como ouvi muitas vezes nos últimos meses. No pleito mais importante de todos, os erros foram sempre em “favor” de Marina e Dilma. Em nenhum momento a Aécio foi atribuída a quantidade de votos que ele, no fim, viria a ter. Alguns erros nas disputas estaduais, por outro lado, se encarregaram de deixar claro que os levantamentos também não favorecem PT ou PMDB. Ou seja, os deslizes são sortidos e só na urna saberemos para onde foram os votos, para desespero dos marqueteiros.

2 - Tirica não é acidente

O Palhaço e nobre deputado Tiririca se reelegeu e, de novo, teve uma quantidade de votos exorbitante. Como há quatro anos, Tiririca não fez campanha política. Ele usou seu espaço de TV para outra coisa. Atribuir seus votos à falta de “consciência política” ou à “baixa instrução” da população é escolher o diagnóstico mais fácil. Aliás, colocar a culpa no eleitor é quase sempre a opção mais desonesta. Afinal, se os partidos e candidatos “sérios” têm bons projetos políticos e neles a consciência política transborda, então devemos concluir que são, no mínimo, incrivelmente incompetentes por não conseguirem convencer os eleitores de dar-lhes seus votos e não ao rapaz que imita o Roberto Carlos com um bife na mão. Tiririca é sintoma de um problema talvez incorrigível da democracia: o voto pouco ou nada tem a ver com escolhas racionais, com a análise de propostas e com o conhecimento de cada candidato (aliás, tem candidato a presidente sem programa divulgado até agora). Os fatores que levam à escolha são de outra natureza. Caros políticos e cidadãos que se consideram bem informados, se vocês ainda não entenderam isso, não culpem o Tiririca, nem a baixa instrução, nem os eleitores.

3 – Campanha de difamação dá resultado

Não adianta criticar. Se você, em dado momento, mudou seu voto depois de ter assistido a uma propaganda eleitoral em que o candidato da oposição era pintado como o diabo na Terra, saiba que você deu sua parcela de contribuição para que campanhas de difamação continuem pautando os debates eleitorais. Saiba que provavelmente a sua, caro cidadão bem informado, também não é uma escolha racional. Saio desse pleito ainda menos iludido com as vantagens da democracia ao ver que, em parte, grandes oscilações nas pesquisas ocorreram após um candidato ser alvo de uma incrível campanha difamatória perpetrada, em geral, por outro candidato com reputação no mínimo vergonhosa. Viva a festa da democracia.

4 – Marina errou feio

Marina Silva meteu os pés pelas mãos desde que se filiou ao PSB e acabou pagando o pato no fim das contas. No afã de se mostrar uma alternativa verdadeira ao velho jogo político, ela subestimou o pragmatismo da política partidária que, até certo ponto, é, sim, positivo. No PSB, ela sempre foi um estranho no ninho. Sua “base” de consulta e decisão política era a Rede Sustentabilidade, que, não sendo partido, o que é? Faltou profissionalismo à campanha de Marina, no melhor sentido do termo. Não soube rebater críticas de quem não tinha moral alguma para fazê-las. Mostrou-se uma figura suscetível aos ventos de cá e de lá, enquanto Dilma e Aécio, que nisso são exatamente iguais a Marina e não têm escrúpulos em se aliar com o pior da política nacional, souberam se resguardar desse tipo de ataque. Foram mais profissionais e um deles será presidente da República.

5 – O Brasil não vai acabar

Você pode ser contra ou a favor do Bolsa Família. Pode ter a opinião que for sobre a previdência. Independente da sua opinião, saiba que não há força política alguma nesse país capaz de acabar com o Bolsa Família ou com a aposentadoria. Ao menos não nos próximos anos. Teremos um 2015 difícil, com Aécio ou com Dilma. Sofreremos com inflação e gastos públicos. E a tendência é que, depois disso, as coisas comecem a voltar ao normal. O próximo presidente deverá ter pouca margem de ação sobre esses fenômenos. Tudo continuará mais ou menos do mesmo jeito. Então, apesar de sua timeline anunciar o apocalipse caso PT ou PSDB se elejam, pouca coisa deve mudar.

6 – O voto dos pobres

O Brasil é um país com mais pobres do que ricos e são eles que decidirão as eleições. Se votarem no candidato que você apoia, será um sinal de que a democracia venceu, de que as pessoas escolheram quem realmente fará algo por elas. Você verá isso como uma confirmação de que você mesmo estava certo, e que o país está andando rumo certo. Mas se, por acaso, o vitorioso for o candidato contra o qual você luta no facebook, o voto dos eleitores de baixa renda representará a falta de instrução das pessoas, será visto por você como um sinal do atraso do país em termos de cidadania e de consciência política. Ou pior, será demonstração cabal de que a democracia ainda é frágil no país. É eu sei. Você aí que está engajado em uma das campanhas para presidente já alcançou a verdade e quem não concorda contigo só pode ser ignorante ou mal intencionado. Parabéns, continue assim.

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Sobre

As relações entre governos, organizações e demais atores no espaço físico, virtual e conceitual que extrapola as fronteiras de um Estado lança novos desafios para a atuação da fraternidade na política. A ausência de um agente com legitimidade coercitiva expõe o drama, mas também as possibilidades, da relação fraterna entre sujeitos em condição de paridade, responsabilidade mútua e liberdade para cooperar ou não uns com os outros. Neste blog, abordaremos os desdobramentos desse fenômeno.

Autores

Thiago Borges

Repórter da revista Cidade Nova há quase dois anos, é jornalista formado pela faculdade Cásper Líbero. Foi redator da agência internacional de notícias Ansa por três anos e concluiu recentemente uma pós-graduação em Filosofia Política no Instituto Universitário Sophia, em Florença – Itália.