A caneta e o fuzil

No fim de maio, a Colômbia irá às urnas escolher entre dois candidatos que poderiam estar do mesmo lado, mas que, por poucas divergências, se encontram em pólos opostos. O pivô da divisão entre a situação e a ex-situação chama-se Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia. Enfraquecida pelos mais de 50 anos de atividade armada no país, a principal guerrilha do continente ainda exerce forte influência no jogo político.

O eixo da divergência é a abordagem de combate ao grupo armado. A nova oposição, liderada pelo ex-presidente Álvaro Uribe e que tem Óscar Iván Zuluaga como candidato, é contra a política do atual governo de Juan Manuel Santos de negociar a rendição com os guerrilheiros.

A linha de Uribe tem lá sua coerência. Se partirmos do conceito de que a política é a atividade por meio da qual os homens se governam e conciliam seus interesses sem a necessidade de aniquilar os inimigos, a atividade guerrilheira é, pelo método de ação que adota, a negação da política.  Assim, não há meios políticos para estabelecer diálogo e o que resta é o combate militarizado. Foi isto o que pautou o governo do agora opositor: forte incentivo a ações do Exército em operações terrestres e de inteligência, com o apoio declarado de Washington.

Não deu certo. Uribe fracassou e precipitou seu país em um período de escalada de violência com poucos resultados concretos, um volume enorme de recursos públicos desperdiçados e a presença incômoda dos Estados Unidos (com seu histórico de intervencionismo regional) em seu território.

Ao suceder Uribe, Santos tomou distância do que se fizera naqueles anos e iniciou uma nova abordagem, abrindo caminho ao diálogo com a cúpula das Farc. Diante do fracasso do combate militarizado, pouco havia a ser feito. A guerrilha, também fragilizada pelos anos de enfrentamento, aceitou iniciar o diálogo pela deposição das armas. A verdade é que pouco se avançou também com essa opção e o governo é hoje motivo de piada por fazer papel de bobo, entretendo-se em rodadas de negociações que caminham a passos lentos, enquanto na floresta amazônica as células da guerrilha continuam a operar.

O pleito das próximas semanas será, de certa forma, uma sentença dramática. O eleitor deve escolher entre dois modelos que produziram poucos resultados. A favor de Santos, contudo, conta o fato de ele entregar à próxima gestão uma Colômbia com menos cara de país em guerra civil, com mais autonomia em relação a Washington e menos recursos desperdiçados. Santos fez a escolha mais difícil. Optou pelo diálogo e não exigiu que as Farc depusessem as armas para então começarem a conversar. Esta postura esconde uma coerência mais séria e profunda, que nem Uribe, nem Washington reconhecem: em uma negociação, o objetivo final de uma das partes não pode ser exigido como pré-condição ao diálogo. Nada disso elimina o fato de que, fazendo isso, Santos se expõe à possibilidade de ser traído pelos guerrilheiros. Mas quem não está disposto a assumir esse risco, não está pronto para a política.

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Sobre

As relações entre governos, organizações e demais atores no espaço físico, virtual e conceitual que extrapola as fronteiras de um Estado lança novos desafios para a atuação da fraternidade na política. A ausência de um agente com legitimidade coercitiva expõe o drama, mas também as possibilidades, da relação fraterna entre sujeitos em condição de paridade, responsabilidade mútua e liberdade para cooperar ou não uns com os outros. Neste blog, abordaremos os desdobramentos desse fenômeno.

Autores

Thiago Borges

Repórter da revista Cidade Nova há quase dois anos, é jornalista formado pela faculdade Cásper Líbero. Foi redator da agência internacional de notícias Ansa por três anos e concluiu recentemente uma pós-graduação em Filosofia Política no Instituto Universitário Sophia, em Florença – Itália.